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21/05/2017

Mostra no museu Victoria & Albert recriou a trajetória do Pink Floyd


The Pink Floyd Exhibition: Their Mortal Remains (Exhibition Trailer)



LONDRES — Um porco gigante inflável tem flutuado sobre as ruas de Londres. Isso já havia acontecido em dezembro de 1976, quando um balão com 12 metros, em forma de suíno, foi criado para estampar a capa do álbum “Animals” do Pink Floyd. Mas o bicho, que deveria sobrevoar apenas os ares poluídos da usina de Battersea, símbolo da industrialização inglesa, se soltou das cordas e voou sem rumo sobre a cidade. Pilotos foram acionados para deter o fugitivo, voos foram cancelados. O balão acabou caindo numa fazenda, e entrou para a história do rock, passando a acompanhar o Pink Floyd em suas turnês. Hoje o voo de Algie, nome do porco, é controlado. Faz parte da divulgação da exposição “Pink Floyd, their mortal remains” (“Pink Floyd, seus restos mortais”), que o museu Victoria & Albert inaugurou no último sábado para contar a trajetória de uma das maiores bandas de todos os tempos.

Com direito a túnel psicodélico, exposição emociona integrantes do grupo

A mostra do V&A fica em cartaz até 1º de outubro e ilustra as dimensões revolucionárias com que a banda explorou a relação entre música, artes visuais, design, arquitetura e tecnologia. Não é uma retrospectiva apenas para fãs, embora muitos deles saiam de lá com lágrimas nos olhos. A ideia do museu — que fez tributo semelhante a David Bowie há três anos e atraiu multidões — é tocar também os que não conhecem a história de obras-primas como “The dark side of the moon” (1973), “Wish you were here” (1975) e “The wall” (1979).

Réplicas de algumas das guitarras da banda

Há 50 anos, em plena explosão da contracultura, quatro jovens britânicos — Roger Waters, Richard Wright, Nick Mason e Syd Barrett — lançavam seu primeiro álbum, depois de chamar a atenção da cena underground londrina tocando no UFO, clube noturno localizado na icônica Tottenham Court Road, onde as viagens do LSD mudaram o rock para sempre.


O que aconteceu a partir daí é um incomparável percurso musical e visual, que marcou diferentes gerações e vendeu 250 milhões de discos. As vozes de Waters, Mason, Wright (já falecido) e David Gilmour, que substituiu Barrett em 1968, guiam os visitantes por salas multimídia organizadas cronologicamente. Elas foram idealizadas pelo designer Aubrey ‘Po’ Powell, um dos principais colaboradores da banda, responsável por capas de álbuns mitológicas como a que mostra um prisma sobre fundo negro, feita para “The dark side of the moon”, que ainda hoje vende sete mil cópias por semana.

— Buscamos um equilíbrio entre reações provocadas por um visual glorioso e por sentimentos bem mais profundos — explicou Powell.

VIAGEM NO TEMPO

Nick Mason com a Bedford van, primeiro veículo usado por Pink Floyd em suas turnês

A exposição começa com um túnel psicodélico, em estilo toca do coelho de “Alice no País das Maravilhas”, para retratar os tempos de alucinógenos e revoluções dos anos 1960, sublinhando a importância de Barrett, guitarrista e compositor que formou o Pink Floyd, sucumbiu à insanidade e foi afastado ainda na fase inicial do grupo (ele morreu em 2006). Mais de 350 objetos foram reunidos para relatar as transformações vividas pela banda ao longo das últimas décadas, do underground ao mainstream da cultura pop, “sem se curvar à complacência criativa”, como lembram os curadores. Como pano de fundo, as famosas cabines de telefone vermelhas, onipresentes na Londres pré-celular, foram decoradas com manchetes de fatos históricos ocorridos enquanto o Pink Floyd trilhava seu caminho.


Cartas, pôsteres, fotos, vídeos, instrumentos musicais, jornais e revistas, além de objetos pessoais, narram essa evolução e as conexões fundamentais que mudaram a maneira de se produzir e divulgar música. O processo de criação das capas dos discos tem destaque. Para captar a imagem de um homem em chamas no álbum “Wish you were here”, muito antes de o mundo sonhar com as mágicas do Photoshop, um dublê foi incendiado 15 vezes até que o fotógrafo Storm Thorgerson — outro parceiro-chave da banda — se desse por satisfeito. A banda também criou um balé, coreografado pelo francês Roland Petit, e trabalhou com o cineasta Michelangelo Antonioni.


As performances ao vivo são tema das salas mais impressionantes. Desde os tempos do UFO, o Pink Floyd já se preocupava com cenários e iluminação, refletindo o interesse de Mason, Waters e Wright, estudantes de arquitetura, pela engenharia dos espetáculos. Nos anos 1970, as dimensões de suas turnês foram crescendo, inaugurando uma nova era no conceito e na narrativa dos concertos de rock.


Parte da partitura original para Atom Heart Mother (composta por Ron Geesin)

Na época de “The wall”, Waters vivia uma fase atormentada. Sentia-se cada vez mais distante do público. Queria mais do que uma barreira imaginária entre os músicos e a multidão. A solução foi erguer uma parede formada por imensos “tijolos” de papel, que também serviam de tela para animações, outra marca registrada do Pink Floyd. Na exposição, a parede é recriada, assim como uma réplica da usina de Battersea, símbolo escolhido pelo grupo em sua crítica ao capitalismo.

Um alienígena, ou um símbolo dos males da sociedade?

Pink Floyd tornou-se mais político ao longo dos anos

Em 1985, Waters deixou o grupo em termos pouco amigáveis. Mas o Pink Floyd continuou batendo recordes. “The division bell”, de 1994, ganhou uma turnê digna de monstros sagrados: atraiu 5,5 milhões de pessoas em 68 cidades e mobilizou um avião militar, dois Boeings 747 e 53 caminhões para transportar as 700 toneladas de aço do palco. É uma história de gigantes, cujo último álbum saiu em 2014.

Você sabia que Delicate Sound of Thunder se tornou o primeiro álbum de rock 
a ser tocado no espaço em 1988?

— Foi bom entrar aqui, ouvir de novo músicas como “Wots ... uh the deal” (de 1972), rever fotos daquele tempo em que éramos jovens. Achei muito bonito — disse Waters, na abertura da mostra, visivelmente emocionado.

Aqui está David Gilmour visitando a Pink Floyd Exhibition

Embora os encontros entre os músicos sejam raros hoje, todos colaboraram com a exposição. Num vídeo comovente, Waters e Gilmour fazem o público esquecer a tensão entre os dois e contam, com ternura, como criaram os versos de “Wish you were here”, inspirada em Barrett, que questionam as diferenças entre paraíso e inferno, céu azul e dor, campos verdes e trilhos de aço, um sorriso e uma máscara.


— Não é só nostalgia — disse Mason, na estreia que reuniu os artistas e os curadores. — É importante contar essas histórias enquanto as pessoas que as viveram ainda estão por aqui. Dois de nós já se foram — resumiu o baterista.





Por Claudia Sarmento (texto)
19/05/2017 - O Globo - Cultura

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